Lisboa 15 de Junho de 2021

1°… há uma definição de arte, do artefacto de Kenneth Frampton que acho bem importante para o fim desta reflexão. De uma maneira simples diz não haver dois objetos iguais… por mais que se pretenda que assim seja ao serem materializados o seu criador incorpora de forma imponderável muitas características para além da sua razão de ser. É precisamente daí que resulta, antes de mais, o valor artístico do objeto. Bem, e se a alma do objeto criado é parte exclusiva de seu criador, o que acontece no processo de criação aos criadores, quando são muitos e o objeto é só um?

2°… ao criar o objeto, a multiplicidade subtil, a diversidade in/consciente e a velocidade das interações do coletivo vão ter maior ou menor impacto íntimo no ser de cada um e modificando a aspiração e a vontade de incorporar.

3°… do conceito à materialização do objecto, o projecto e consequente desenvolvimento da ideia, qual o papel do design no âmbito do projeto social. Talvez o objeto mais relevante a produzir nas dinâmicas coletivas que surgem, será o banco.

Eu explico.

Reunidos para uma atividade coletiva qualquer, tendo em vista a criação de um facto social, hum, tipo para uma exposição, uma manif, feira ou festival,… Para além do natural ajuntamento em roda, sob sombra preferível, tentamos que ao centro de todos, se aclare de igual para igual, tal facto.

E se aos nossos corpos durante essa reunião acrescentasse-mos livremente qualquer artefacto?… Uma mesa redonda, um foco de luz, água, copos, instrumentos musicais, um fogareiro?

E porque não uns bancos que nos permitam estar quietos e confortáveis.

Por isso tem sido o objecto a construir presente em todas as ações que tenho vindo a participar com a mão da Inês.

Foi num momento destes, no outro dia, que percebi todo este contexto que envolve. Tinha acabado um exercício bem curioso (a Inês), bem ao estilo do grupo – com o mesmo conjunto de peças cada elemento teria de construir o seu próprio banco.

Estávamos três à volta de um desses bancos, cada um segurando uma perna que o iriam ligar. 6 mãos seguravam, sobrepunham, procuravam a melhor forma de materializar aquela ideia de banco.

Melhor que um qualquer processo de criação individual, o coletivo é muito, muito mais rico.

Surge, surpreendentemente, dessa dinâmica interativa de grupo: a velocidade, a amplitude de movimento, a dança das mãos, do agir, fazer e refazer…

Em oposição a um método de criação individual, sintético e universal, ponderado a partir de um só ser, fase a fase, sedimentado tecnicamente em desenhos de múltiplas vistas ortogonais numa folha de papel…

Impensável, a partir daqui, achar que o papel do designer no projeto social se limite ao bom desenho no papel e que transparecerá na peça acabada. Muito mais a montante se deve encontrar essa participação.

Texto por Miguel Amado